Pieces of a Woman é mais que um casamente em decadência
Pieces of a Woman, filme Canadense dirigido por Kornél Mundruczó (Deus Branco), não é resumido por um simples enredo de um casamento desmoronado. Além de estar concorrendo ao Oscar de Melhor Atriz para Vanessa Kirby pela atuação magnífica, o longa choca pelos sons e cores frias na ambientação. Mas, ainda assim, os primeiros minutos são seu ápice.
Isso porque os primeiros trinta minutos de Pieces of a Woman não são executados de forma padrão como vemos em outros longas, pelo contrário, é uma trama profunda que a cada minuto fica mais consistente.
Martha (Vanessa Kirby), uma mulher firme e convicta de suas decisões, também por não se importar em agradar a família, é casada com um operário de construções, Sean (Shia LaBeouf), um homem simples e trabalhador, e mal visto pela sua mãe e irmãs.
O casal demonstra afeição pelas escolhas e respeitam um ao outro igualmente, mas, ao longo da trama, a separação física e intelectual vêm tornando as coisas extremamente desiguais para ambos depois de uma morte repentina da filha recém-nascida, que causa angústia e um luto profundo.
Depois do parto não executado com sucesso, Martha definha como mulher, tornando-se, assim como a paleta de cores do filme: fria e distante, sem qualquer cuidado a si mesma e sem vontades sexuais ou sociais. Sean reage, porém, de forma agressiva devido a essa mudança da esposa, e a traição é o primeiro ato de repúdio do homem à sua mulher.
Porém, há um laço indiscutível no filme que vai muito além de Martha e Sean. Na realidade, o filme aborda uma questão familiar entre a mãe da protagonista, Elizabeth, muito intensa.
Desde o início, a relação que sentimos entre Martha e sua mãe é uma mistura perfeita entre desdém e admiração por parte da filha. Uma das cenas mais impressionantes mostra esse laço conturbado quando Elizabeth pede para que Martha lute pelos seus direitos em relação a sua falecida filha, que segundo sua mãe, deveria causar a prisão da parteira Eva (Molly Parker) por incompetência profissional.
Elizabeth diz, por sua vez, com uma voz rouca e potente, que Martha deveria lutar pela vida da mesma maneira que ela lutou durante os primeiros minutos de seu próprio nascimento, e que espera de sua filha a mesma coragem que ela teve durante toda sua vida, levando consigo, um discurso extremamente emocionante.
Porém, Martha não tem a mesma percepção que a mãe em relação à perdas. Ela acredita que a recém-nascida não morreu por conta da parteira, e sim, por um conjunto de erros que ela mesma e o marido cometeram.
Com certeza, Pieces of a Woman diz mais sobre a luta de ser uma mulher independente que precisa superar suas dores e perdas com a sua própria força, e não apenas a relação entre um casal que se perde no caminho.
Martha, brilhantemente interpretada por Vanessa Kirby, nos traduz sua dor e revolta diante de um mundo hipócrita que cerca uma mulher, e Elizabeth, sua mãe, reflete o mundo esperado por uma mulher.
O filme de Kornél Mundruczó merecia ser indicado a mais de um Oscar, não só pelo roteiro formidável que reflete a cada momento o sentimento de perda e o renascimento diante das dificuldades da vida, mas pela direção impecável e atuações deslumbrantes.
Com certeza o longa deve ser lembrado e relembrado por muitas gerações.