LIVRE
O canadense Jean-Marc Vallée conquistou de vez a crítica com Clube De Compras Dallas, filme que rendeu o Oscar aos atores Jared Leto e Matthew McConaughey e mostrou seu talento para transformar a tragédia em inspiração. Em Livre ele repete a fórmula: adaptou uma história real tocante, investiu em uma atriz de talento que anda desacreditada e manteve o mesmo cuidado estético. Mas, será que seu novo projeto foge dos caminhos fáceis dos filmes do gênero?
Livre longa conta a história de superação de Cheryl Strayed, uma jovem mulher que entra em uma espiral de autodestruição após a morte precoce da mãe. Anos depois, ela decide se redimir assumindo o desafio de participar da Pacific Crest Trail, uma trilha de 1700 quilômetros que atravessa os Estados Unidos e chega ao Canadá.
A história ganhou viés dramático pelas mãos do diretor, que tenta a todo momento construir uma história que se conecte ao espectador. O roteiro, escrito por Nick Hornby (Alta Fidelidade) com base no livro autobiográfico de Cheryl, alterna momentos em flashback e o percurso enfrentada por Cheryl. Aos poucos vamos conhecendo detalhes da infância e da adolescência, a relação mãe e filha, a cumplicidade com o irmão, o romance com o ex-marido. As cenas procuram relacionar passado e presente, como se a experiência-limite aflorasse suas lembranças.
O que poderia ser retratado como uma história açucarada ganha novos contornos justamente pelas características complexas de Cheryl. A dupla Laura Dern e Reese Whitherspoon, em seus melhores papeis em anos, ajudam a aumentar a carga emocional desta jornada. Em um momento em que o cinema carece tanto de protagonistas que fujam do típico retrato feminino que Hollywood já esgotou, ver uma mulher independente, dona de si e sem pré-julgamentos ser transposta com tamanha ousadia é elogiável.
Vallée fez opções em Livre. Há poucos momentos em que a aventura vivida por Cheryl é retratada com a intensidade que poderia. É uma experiência de visual exuberante, sem dúvidas, mas o longa não consegue fugir da fórmula da emoção fácil. O resultado é um filme que flerta com o deprê, sendo muitas vezes exageradamente sentimental. Livre se banha na emoção de algumas cenas realmente tocantes, mas não evita a pieguice barata para levar as grandes plateias as lágrimas.
Histórias em que a natureza expurga o homem de seus pecados não são pouco comuns. Se antes a redenção acontece pela tragédia (como eu 127 Horas) ou pela experiência (Na Natureza Selvagem é um exemplo), em Livre ela se faz quando Cheryl assume sua imaturidade, seja para lidar com o que a vida lhe deu, seja para superar o que ela lhe tirou. Um desafio que nos impacta, não teria como ser diferente.